A Jéssica Paiva foi a grande vencedora do Prêmio Oxford de Design 2018, com o tema: O folclore ao redor do mundo: o encontro da imaginação com a arte”. Nessa edição ela ajudou a escolher 20 dos finalistas que foram para avaliação do júri técnico.
Confira a entrevista com a Jéssica Paiva
Puxe uma Cadeira: Fala um pouquinho da tua participação no Prêmio Oxford de Design, como foi?
Jéssica Paiva: Soube do Prêmio de última hora, através do Instagram, já na semana final do prazo para inscrições, mas o tema me interessava tanto que senti que devia participar mesmo assim. Então, fui logo resgatando as manifestações do folclore brasileiro que faziam parte da minha vivência e imaginário, em busca de algo com que me identificasse. Venho há alguns anos lendo e me aproximando mais do feminismo, por isso, a lenda da Iara me tocou em especial. Queria dar uma nova leitura à história daquela guerreira que teve sua vida ameaçada pelos próprios irmãos, que não aceitavam sua posição de igualdade na luta. A confirmação do tema veio com a música Reconvexo, de Caetano Veloso, uma das minhas preferidas. Nela, Iara é destemida, a sereia que dança, exatamente como eu queria retratá-la.
A partir daí busquei no meu estilo e universo visual a melhor forma de dar vida à lenda. Mergulhei nas pinturas indígenas em busca de texturas, mas sem perder o traço delicado e minimalista que tento trazer para o meu trabalho. Lembro que na noite do último dia do prazo para inscrição desmarquei um jantar com minhas amigas dizendo: “preciso dar os últimos retoques num trabalho bem legal que estou finalizando. Acho que vai ser importante”. Não sabia eu o quanto!
PUC: Qual o principal desafio de desenhar em louças?
JP: Acho que o grande desafio ao desenhar um conjunto de louças é pensar nas peças como um todo, de maneira que elas coordenem uma mesma linha visual sem que fique repetitivo. Não gosto de pensar numa ilustração ou padrão isolado, as peças precisam conversar entre si, mas ao mesmo tempo ter contrastes de ritmo e cores. Foi isso que busquei ao equilibrar peças estampadas, cores chapadas e ilustrações localizadas.
Além disso, acho legal lembrar que, ao desenhar em objetos que fazem parte do dia a dia das pessoas, temos a oportunidade de trazer mais alegria e poesia para a rotina de quem os utilizará. Sendo assim, fica sempre o questionamento: que sentimento você acha que seu trabalho vai despertar nas pessoas?
PUC: O que mudou depois do prêmio?
JP: Acho que a principal mudança depois do prêmio foi interna. Sei que não é o ideal, mas acabamos esperando uma aprovação externa pra acreditar no nosso trabalho, né? Então sinto que o Prêmio me fez olhar com mais carinho para as coisas que produzo. Me deu mais confiança no meu trabalho e na minha capacidade de realizar coisas novas, em superfícies que ainda não explorei.
Lembro que na primeira etapa do prêmio, a votação popular, tive que deixar muita vergonha de lado para divulgar as peças que inscrevi. Um monte de gente que eu admiro também estava participando e eu me achava meio cara de pau de estar ali no meio, sabe? (risos) Mas essa exposição quase que forçada me fez internalizar que, por mais que eu admire o trabalho de outras pessoas, o meu também tem seu próprio valor e estilo.
Depois do Prêmio
PUC: O que você faz hoje? Quais são seus principais projetos?
JP: Atuo como freelancer nas áreas de design gráfico, ilustração e estamparia. Meu portfólio: jessicapaiva.com.br. Já desenvolvi projetos para clientes incríveis, como Globo, G1 e Bem-Te-Vi. Além disso, sou mestranda do departamento de Design da UFPE, onde pesquiso as relações das estampas com a construção de identidade.
Desde que vi meu trabalho estampando as louças da Oxford, me despertou a vontade de explorar superfícies novas, ver meu trabalho ganhando vida além da tela/papel. Pra isso, topei participar de projetos em áreas diferentes, que me tiraram da zona de conforto e têm rendido projetos bem especiais!
Uma parceria com a Obba Produções, por exemplo, me levou a explorar o mundo da cenografia de eventos. É bem mágico ver meus desenhos ganharem vida virando ambientes lúdicos para as pessoas se divertirem. O projeto do Arraial do Plaza Shopping é um exemplo do que já fizemos, reunindo cactos gigantes e bandeirolas juninas numa festa de cores. Até o fim do ano novos mundos vão ser criados a partir dessa parceria!
Outro projeto que estou ansiosa para ver o resultado são as estampas que desenvolvi para a loja de móveis autorais Wunderbar. Duas coleções foram criadas com exclusividade para a marca: a Lendas, uma coleção infantil inspirada das lendas do Brasil, e a Anauê, inspirada no universo indígena. As estampas vão cobrir poltronas, sofás, almofadas e até virar papel de parede. Estou curiosa para ver tudo pronto.
É bem bom olhar para esses novos projetos e notar que o Prêmio não só abriu portas, mas também me aproximou das temáticas que gosto e acredito.
O Prêmio Oxford de Design 2019
PUC: O que você achou do tema desse ano que é “Que futuro você vê?”
JP: Adorei o tema desse ano particularmente porque acho que vai levar a lugares completamente diferentes do tema do ano passado. Estou bem curiosa pra saber o que vai surgir a partir daí! Pensar no futuro é sempre interessante e pensar o futuro sob uma perspectiva lúdica e criativa abre espaço para revivermos a esperança de um mundo mais bonito.
Também gostei bastante da maneira com que a pergunta foi feita: não se pergunta sobre o futuro em geral, se pergunta sobre o futuro subjetivo de alguém, sobre a expectativa particular de uma pessoa sobre o que vem por aí. Em tempos em que nos interessamos cada vez menos pelo ponto de vista do outro, é bom ver um concurso inteiramente dedicado a visões diferentes de futuro.
PUC: Que dicas você daria para os participantes? O que uma arte deve ter pra te encantar?
JP: A dica que eu dou para os participantes tem tudo a ver com o que me faz encantar por uma obra: buscar traduzir algo muito íntimo, que você não imaginava ser dizível, mas que ganha corpo na arte. Entendo que ser original tem a ver com se voltar para as origens. Não necessariamente uma origem geográfica, de onde nascemos, mas a origem daquilo que nos forma, nos compõe. Tenho a impressão de que quando nos voltamos pra dentro, nos conectamos ao outro de maneira mais verdadeira. Isso que salta aos meus olhos quando me encanto com uma obra. Assim, meus conselho aos participantes é que busquem mais referências internas que externas.
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